domingo, 12 de fevereiro de 2017

Um pouco de poesia: Ievguêni Ievtushênko


Com base no site http://www.evtushenko.net/, o poeta nasceu no dia 18 de Julho de1833 como Ievguêni Alksándrovitch Ievtushênko, na parada Zimá, região de Irkutsk, Sibéria, filho de Aleksandr  Rudol'fovitch Gangnus e de Zinaída Ermolaevna Ievtushênko. O pai, que viveu de 1910 a 1976, era geólogo, e a mãe, tammbém geóloga, era atriz e personalidade veterana da cultura soviética, também nascida em 1910, mas que sobreviveu ao marido até o ano de 2002.
O do meio é V.Vysotski, poeta,cantor 
e ator russo diante da estação de Zimá
 Zimá



Zima: Casa-Museu  de Ievtushênko

Crédito das fotos: http://zolotoyolymp.ru/post.php?id=4399

Desde tenra infância, Ievtushênko se julgava e se sentia Poeta. Isto se evidenciava em seus poemas juvenis publicados  em suas Obras Completas (8 tomos), datados dos anos 1937, 38 e 39. Assim, entre 5 e 7 anos ele já  dava mostras de talento, apesar de seus versos ainda serem obviamente bem infantis.

Ievtushênko escreveu, também, prosa, sempre no mesmo tom de seus poemas, ou seja, de acordo com o adendo de "Os Frutos Selvagens da Sibéria" editado pelo antigo rculo do Livro, numa tradução do francês, o tom do autor era sempre a favor do ser humano.

"Seus grandes adversários são a hipocrisia e a estagnação da sociedade. Um revolucionário por definição, seguindo o exemplo de outro grande poeta russo, Vladímir Maiakóvski, ele encara a Rússia contemporânea (1) muito distante dos padrões de puro idealismo que atribui aos primeiros anos da revolução comunista que derrubou o regime czarista de 1917".
 Ainda segundo o citado livro, Ievtushênko sempre foi um crítico do regime, tendo problemas com seus diversos governos. Dissidente soviético, foi o primeiro a se levantar contra Stalin, de acordo com seus dados biográficos constantes da orelha do livro "Não morra antes de morrer", de sua autoria e editado no Brasil pela Editora Record.

Não vou me estender mais em seus dados biográficos, que podem ser encontrados na internete, uma vez que o objetivo principal do post é o de disponibilizar alguns de seus poemas, o que faremos a seguir.

Minha Letra 

Minha letra não é caligráfica. 
Sem seguir as regras da beleza,
as palavras se atropelam,
cambaleando, 
cambaleando,
como se tivessem levado um soco nos queixos.

Mas você, o descendente, meu crítico textual, 
seguindo nos calcanhares do passado,
leve em contas esses escolhos
nos quais seu ancestral tropeçou.

Ele andou num belicoso barco de frete costeiro,
um tanto arrogante,
mas você
deveria poder ver além da letra torta,
não apenas os traços do autor.

O seu ancestral escreveu atirado de um lado para o outro,
fustigado por rajadas de vento que não o mantinham aquecido,
sem ter o consolo
de hábitos como o maço
de cigarros a que estava acostumado.

É claro, fomos corajosamente longe,
mas não é fácil escrever uma só linha,
quando estão batendo a sua cabeça, com gosto,
contra o tabique.

Arriscando pele e osso,
é difícil cantar loas,
quando o que você te compele,
não a louvar, mas a vomitar... 
(extraído do livro "Poesia soviética", Editora Algol)

 Batem à porta

"Quem é?" -
"A velhice.
Vim ter contigo".
"Volta mais tarde.
Estou ocupado.
Tenho coisas que fazer!"
Escrevi.
Telefonei.
Estraguei uma omeleta.
Depois abri a porta,
mas não estava lá ninguém.
Talvez uma partida dos amigos.
Ou talvez não ouvisse bem o nome.
Não foi a velhice -
Mas a maturidade que aqui esteve,
não pôde esperar, suspirou 
e partiu! 
(Extraído do livro Poetas Russos, ed.bilíngue russo/português, da Relógio d'Água Editora) 


Assassinato 

Ninguém  dorme mais bonito do que tu.
Mas temo
que acordes agora, exatamente,
e me toques com um olhar indiferente, assim de leve, de passagem,
e cometas o assassinato da beleza.
(extraído do livro "Poesia soviética", Editora Algol)
 

 "Na sacada" (o melhor dos meus poemas ruins)


 A consciência desperta até mesmo nos tanques.
Yeltsin se ergue sobre a torre,
e atrás dele
não estão os fanstasmas do Kremlin,
mas o nosso povo simples,
enganadoramente simples...
que ainda não desapareceu...
e mulheres russas cansadas...
vítimas de filas que nunca se acabam.

Não,
a Rússia numa mais  haverá de se ajoelhar!
Conosco estão Pushkin, Tolstói.
Conosco está o povo,
para sempre desperto,
e o Parlamento russo,
como um cisne branco da liberdade ferido,
defendido pelo nosso povo, 
nada para a eternidade.

Já havia escrito muitos poemas ruins.
Mas eu sabia que este era o melhor de meus poemas ruins.

(extraído do "Não morra antes de morrer")



Babi Iár (2)

Não há monumento em Babi Iár.
Um abismo brusco como um túmulo rude.
Tenho medo.
Hoje tenho a idade 
de todo o povo judeu.
Neste momento parece-me 
que sou judeu.
Aqui labuto no Egito antigo.
Aqui pereço sacrificado na cruz, 
e até hoje tenho as cicatrizes dos pregos.
Dreyfus (5)
sou eu.
O pequeno -burguês
é meu denunciante e juiz.
Estou atrás das grades.
Cheguei ao fim.
Ferido, 
cuspido, difamado.
E as damas delicadas com rendas de Bruxelas
espetam-me os chapéus-de-sol na cara.
 Sou um garoto de Bielostok (3).
O sangue corre, salpicando os campos.
Os zaragateiros de taberna
têm hálito de vodka e cebola.
Uma bota bate-me, sem forças.
Em vão suplico a esses valentões de pogrome.
Enquanto eles riem e gritam:
"Bate nos judeus, salva a Rússia!"
O mercador bate na minha mãe.
Oh, meu povo russo! 
Eu sei 
que tu
tens a alma internacional.
Mas aqueles que têm as mãos sujas
muitas vezes jogaram com o teu nome limpo.
Eu conheço a bondade da minha terra.
É uma coisa vil,
é uma pouca vergonha
os anti-semitas chamarem-se "União do Povo Russo " (4)!
Sou 
Anne Frank (6)
transparente como um ramo de abril
E amo.
E não preciso de frases.
Do que preciso
é que nos encaremos.
Como podemos ver pouco
e cheirar!
São-nos negadas as folhas,
é-nos negado o céu.
Mas podemos fazer tanto
- ternamente
abraçar-nos num quarto às escuras.
Vêm para cá?
Não temas. São os tons 
da Primavera:
a Primavera está a chegar.
Vem até mim.
Dá-me os teus lábios depressa.
Estão a arrombar a porta?
Não, é o gelo que se quebra...
A erva alta sussurra em Babii Iár.
As árvores parecem rudes,
como juízes.
Aqui tudo grita silenciosamente,
e, tirando o chapéu,
sinto-me encanecer
lentamente.
E eu próprio
sou um maciço grito sem som
por cima dos milhares de milhares enterrados aqui.
Sou 
todos os velhos
aqui abatidos a tiro.
Sou 
todas as crianças
aqui abatidas a tiro.
Nada em mim
esquecerá nunca!
A "Internacional", 
deixai-a soar
quando o último anti-semita da terra
estiver enterrado para sempre.
No meu sangue não há sangue judeu.
Mas, na sua raiva rude, todos os anti-semitas
têm que me odiar agora como a um judeu.
E por isso mesmo
sou um verdadeiro russo!
(19 de setembro de 1961)
(Extraído do livro Poetas Russos, ed.bilíngue russo/português, da Relógio d'Água Editora) 

Alguns poemas soltos e sem título, extraídos do já citado "Não Morra antes de morrer":

 
Muito em minha vida me foi dado, 
Mas o que ~eu não tenho 
É o direito de  optar livremente 
Entre o lixo e a merda.
(Escrito em resposta à imprensa britânica, por artigos maliciosos em relação a ele)
 Ps: peço que os que não concordarem com o pensamento do poeta, que me poupem de críticas por este post: o blog Russia Show não é de pensamento único e aqui não estamos preocupados com posicionamentos políticos e sim em mostrar todas as principais expressões culturais possíveis da Rússia e URSS. Projeto meio megalomaníaco  pois, visto o tamanho do país e de sua riqueza cultural, sempre o muito que mostrarmos ainda será pouco.
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Notas da Milu
  (1) Ano 1981, quando o livro foi editado no Brasil.
(2)  De acordo com a Wikipedia, ravina localizada em Kiev, capital da Ucrânia, conhecida como o locas de um dos maiores massacres de judeuse civis da então União Soviética pelos nazistas, durante a 2ª Guerra mundial. Também não judeus foram levados para lá pelos nazistas e assassinados barbaramente.
(3)  Cidade situada no nordeste da Polônia, próxima à fronteira da Bielorrússia. 
(4) Fundada sob o czarismo, em 1905, entidade de cunho anti-semita. 
(5)militar Alfred Dreyfus, capitão de origem judia, do exército francês, acusado, durante a 2º guerra, injustamente, de traição.Foi um escândalo na época, que repercutiu dividindo a França pelo carater nitidamente anti-semita do caso.
(6)Annelies Marie Frank, adolescente alemã de origem judaica, vítima dos nazistas e que se tornou mundialmente conhecida após a publicação de seus diários, sob título de O Diário de Anne Frank.


 
 

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