sexta-feira, 9 de abril de 2010

A HORA E A VEZ DE MAKSIM GORKI (veja e ouç o autor em vídeo)

Auto Retrato

Maksim Gorki ficou meio que estigmatizado como "o autor do regime", pelo simples fato de ter sido ativista político, com prisões ainda no período tzarista e, sobretudo, ter sido um grande amigo de Lenin. Com isto, o Regime foi "complacente" com ele (o que não impediu, entretanto, que Trotsky, já no exílio, tenha levantado a polêmica, afirmando que Gorki teria sido morto, envenenado, por Stalin).


Acrescenta-se a isto o fato de ele ser, para os russos, uma espécie de José de Alencar para os brasileiros da minha geração: sua leitura foi obrigatória por muito tempo nas escolas, assim como o citado escritor brasileiro o era nos meus idos tempos de colégio. Um dia, numa livraria da Rua Arbat, em Moscou, eu procurava seus livros e a vendedora me perguntou espantada porque eu leria justamente Gorki...Comprei assim mesmo. Já li toda sua obra e amei. Seu estilo é, naturalmente, mais popular do que o de outros clássicos russos, mas nem porisso pior. Ele é, dentro de seu estilo ativista, proletário, de denúncias sociais, grandioso. Vale a pena conhecer sua obra e sua vida: ele, definitivamente, não foi o "garoto propaganda"
do regime! Foi um grande escritor, tão grande como só a Rússia soube dar ao mundo!



Seu nome era Alexei Maksimovitch Peshkov. Maksim Gorki foi seu nome artístico (Maksim era o nome de seu pai e, em russo, Gorki significa, literalmente, amargo, pseudônimo que combinava perfeitamente com as agruras de sua vida). Ele nasceu no seio da família de um carpinteiro no dia 16 de março de 1868, na cidade de Nizhni Novgorod, matéria de um post recente em nosso blog (ao que parece, nos últimos anos de sua vida trabalhou no escritório de um cia. de navios mercantes de Astrakhan). Nasceu no então Império Russo e morreu durante os tempos da União Soviética, em 18 de junho de 1936, na mesma cidade natal, então batizada com o nome de "Gorki", em sua homenagem, por ordens de Stalin.

Alexei ficou órfão muito cedo( perdeu o pai aos três anos e a mãe aos 10), tendo sido criado pelo avô materno, também proletário: tintureiro. Na casa deste avô moravam outros irmãos de sua mãe, com suas famílias. A coisa era um horror. Seus tios - bêbados e ociosos, irritavam o avô, que costumava, nestas horas, bater nos netos de forma super violenta, inclusive no pequeno Alexei.
Claro que uma infância vivida em tal ambiente, iria marca-lo muito, tanto que chegou a narrar estes acontecimentos em sua trilogia autobiográfica.

Em virtude de sua pobreza, sofreu humilhações na escola ( usava roupas dos outros, não raro até da mãe e da avó). Chegou a cometer pequenos roubos para ter o que comer, mas - sobretudo - para adquirir livros. Lia aos montes.
A mãe morreu de tuberculose e o avô o pôs pra correr, mandando que ele fosse "ganhar o seu pão", o que veio a ser título de um de seus excelentes livros. Saiu de casa, ganhou o mundo fazendo pequenos trabalhos em lojas, trabalhando de engraxate, em construções e como auxiliar de cozinheiro em um navio. A convivência com o majestoso Volga o empolgava. Continuava a devorar livros. Mais tarde, arrumou um emprego em um ateliê de pintura em sua cidade. Foi preso várias vezes, por seu relacionamento com círculos subversivos, durante o regime tzarista.

Toda esta vida repleta de dificuldades serviria para dar rumo ao seu estilo literário, marcado, essencialmente, por sua luta pela sobrevivência.
 "Eu nunca esperei ajuda de fora, nem contei com a ajuda da sorte...Eu muito cedo compreendi que os homens criam sua resistência ao meio ambiente", escreveu Maksim Gorki.
Gorki era casado com Ekaterina Pavlovna e teve dois filhos: Maksim e Katiusha. E teve, também, uma amante, a atriz Maria Fiodorovna Andreieva, que encenou sua peça "Os Pequenos Burgueses" e era, também, casada. Este relacionamento levou o escritor a uma separação amigável da primeira esposa.


em família
Com o filho Maksim
Com a amante Andreevna
 
Sua amante tornou-se, depois, sua companheira de todas as horas, desde 1903 até 1921, quando - por questões de negócios assumidos junto ao novo governo, acabam se separando e ele se casa com uma terceira mulher, desta vez sua secretária, Mária Ignatyevna Zakrevskaya-Benkendora-Budberg, uma das suspeitas de te-lo envenenado; mas todas estas "fofocas" dos bastidores seria matéria para mais de um post. O certo é que sua primeira esposa, Ekaterina, não gostava da segunda, mas era amiga da terceira. Ufa, que confusão!


http://astrologica.ru/i/content/GU1.jpg

O escritor e Mária Ignatievna, sua terceira esposa,
suspeita de ter envenenado o escritor

Gorki foi muito amigo dos escritores Tolstoi e Tchekhov, ambos já no auge da fama, enquanto Gorki dava seus primeiros passos no mundo literário. Enquanto viveu em Kazan, tentando cursar a Universidade com que tanto sonhou, Alexei resolveu visitar Tolstoi, a fim de ouvir sua opinião sobre seus projetos literários.

Tolstoi foi muito gentil, mas não deixou de lhe apontar suas deficiências, tanto gramaticais, quanto estilísticas.Aí estava nascendo um futuro grande escritor. O primeiro passo estava sendo dado. Pouco depois nascia sua primeira obra: Makar Tchudrá, um conto que impressionou o público e os críticos pelo  estilo, originalidade e imaginação do autor.

Tchekhov e Gorki


Com Tolstoi,  em Yasnaya Polyana

exemplar russo do livro "A Mãe" do ano de 1936, ano da morte do autor.
Fonte: www.ozon.ru

 
Meu exemplar: edição de 1985
Capa de 1975

Em seus livros, o autor retratou, basicamente, o proletariado urbano. Tendo vivido por algum tempo entre os mujiques, não gostou deles: eles eram muito diferentes dos operários urbanos, que ele tão bem conhecia.

Após o "domingo sangrento" de 1905, quando uma multidão liderada por um padre ortodoxo se dirigiu portando bandeiras e ícones ao Palácio de Inverno para fazer reivindicações pacíficas a Nikolau II que, mal assessorado, ordenou que os cossacos atacassem esta multidão, Gorki se revoltou demais e passou a abraçar posições mais radicais, tendo sido preso na Fortaleza Pedro-Paulo, em São Petersburgo (foto a seguir).













Depois deste episódio, passou a denunciar tendências burguesas na obra de Dostoievski e Tolstoi.
Algum tempo depois destes fatos, conhece Lenin, com quem teria uma amizade por toda a vida, apesar de ambos terem personalidades e temperamentos contrastantes.
Viveu exilado na América e em Capri até 1913, quando foi anistiado.
Nunca teve por Stalin a mesma amizade e admiração que dedicava a Lenin. Apesar de Stalin ter lhe dedicado honras de estadista quando de sua morte, fica no ar a dúvida levantada por Trotsky, de que o ditador teria sido o responsável por sua morte (Gorki nunca deixou de interferir em favor dos perseguidos)...

 

O escritor com Stalin



Por todas as atribulações que viveu, o escritor chegou a atentar contra a própria vida. Mas a sorte conspirou contra e a bala perfurou apenas um de seus pulmões, lhe dando mais um problema: uma tuberculose, a qual combateu toda a sua vida.

Sua morte ocorreu - aparentemente - por pneumonia e foi enterrado, conforme já dito anteriormente, com todas as honras de um estadista, o que poderá ser conferido no documentário a seguir. O vídeo está em russo, não é legendado, mas com certeza irá interessar a muitos leitores, por mostrar algo difícil de se ver por aqui: o enterro do escritor, bem como ele próprio, em vida, sua casa, ver Stalin, Andre Gide, etc.






Em maio de 1936 ele adoeceu seriamente. No dia 27 voltou de Teceli, região repleta de datchas, para Moscou e, no dia seguinte, começou a se preparar para ir para a sua datcha em Gorki, hoje Nizhni Novgorod.


Já na estrada, tomou o rumo do cemitério de Novodevitche, com o intuito de visitar o túmulo de seu filho Maksim, falecido em 1934, aos 37 anos.


O escritor no enterro do filho

O dia estava frio, ventava. À noite, conforme lembranças da enfermeira O.D.Tchertkova (ele não estava sozinho), Gorki começou a apresentar alterações. Subiu sua temperatura, ficu fraco, indisposto. A doença se desenvolveu rapidamente e já no dia 8 de junho estava a beira da morte. Morreu no dia 18, na cidade de Gorky, nos arredores da capital,  com um detalhe interessante:
 Gorki morreu na mesma casa onde 12 anos antes morria Lenin. 

O corpo foi sepultado na Praça Vermelha junto do mausoléu do dirigente comunista. Os médicos concluíram então que morrera por causa de uma pneumonia.Mais tarde, porém, a justiça stalinista acusou os"agentes de  Trotski e fascistas" de o terem envenenado. Foram acusados Genrikh Iagoda, chefe da polícia secreta soviética, Vladimir Kriutchov, secretário de Gorki e agente da polícia, e vários médicos do Kremlin. Esta foi uma das acusações mais graves no julgamento do "bloco de direita trotskista e anti-soviético", que levou ao fusilamento de todos os réus.
Se foi um assassinato, a ideia é que poderia ter sido planejado por Stalin e a liquidação dos executores servira apenas para não deixar rastros. Como se vê, sua morte é cercada de mistérios que, provevelmente, jamais serão conhecidos.

Ele se foi, mas sua obra fez com que se tornasse um imortal, ao lado de seus conterrâneos.

O escritor francês André Gide compareceu ao seu enterro, tendo feito discurso em sua homenagem na Praça Vermelha, em Moscou:

http://www.nndb.com/people/277/000087016/gide-2.jpg

"Camaradas, a morte de Maxim Gorki não toca somente a Rússia, mas o mundo inteiro. Ele emprestou sua voz àqueles que não se podiam fazer ouvir. Ele hoje pertence à história, ao lado dos maiores" (André Gide)


Museu Maxim Gorki, em Moscou
Prédio onde viveu em Leningrado

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entêrro de Gorki

O
bras de maior destaque:
  • Makár Tchudrá (1892) (novela)
  • Tchelkach (1895)
  • A velha Izerguíl (1894-1895)
  • Gente esquecida (1897) (novela)
  • Fomá Gordéiev (1899) (Romance)
  • Pequenos burgueses (1901) (tetro)
  • O submundo (1902) (teatro)
  • Os veranistas (1904) (teatro)
  • Os inimigos (1906) (teatro)
  • A mãe (1906-1907) (romance)
  • Infância (1913-1914) (romance autobiográfico)
  • Minhas universidades (1923) (idem)
  • A casa dos Artamonov (1925)
  • Quarenta anos. A vida de Klim Sanghin (1925-1936), tetralogia
  • Ganhando meu pão(romance autobiográfico, meu preferido)
Ele escreveu muitas outras obras que, por motivos de preguiça, deixo de anotar.
Não poderia deixar de recomendar, aqui, a excelente biografia que Gorki escreveu sobre Tolstoi. Acho que é uma das melhores que já li.

Termino o post, com um outro vídeo que mostra o escritor vivo, em movimento, discursando,em família: um verdadeiro encontro com ele.  Adorei ouvir a voz dele, que nem imaginava como seria. Para os russo falantes, claro, o vídeo possui um interesse extra; no entanto, não deixa de ser de muito interesse para todos os admiradores deste gigante da literatura russa.








Fontes:
 http://my.mail.ru/mail/lekar-zwer/video/

Um comentário:

Poliana Macedo disse...

"Pintou o estado social e moral dos antigos servos e deu vida à literatura do seu país, que havia um quarto de século nada produzia de notável".

http://www.praestudar.com.br/2012/11/maximo-gorki.html

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