RICHARD SORGE, O MESTRE DA ESPIONAGEM SOVIÉTICA

Consagrado, em 1964, com o título "Herói da União Soviética", com direito a estátua no centro de Moscou e tudo o mais(foto abaixo), Richard Sorge foi um  espião de muitas faces, que ajudou, com suas informações precisas, a vitória russa na segunda guerra mundial.

Sorge nasceu em Baku (Azerbaijão), durante o Império Russo. Era filho de um alemão com uma russa. Aos três anos de idade, a família mudou para a Alemanha. 

 Casa onde Sorge nasceu, no subúrbio de Sabunchi, em Baku. 

Em 1914, aos 18 anos, se alista como voluntário para combater na primeira guerra. Combateu apenas dois anos, já que foi ferido nas pernas, promovido a cabo e enviado de volta para casa como herói.Em 1925 se muda para Moscou, ingressando no partido comunista. Uma ressalva: seu tio havia sido secretário de Marx.

Em 1930 parte para a China em missão pelo serviço de espionagem soviético, fazendo aí seu nome como jornalista independente. Se familiariza com a Ásia e parte para o Japão, em 1933,  também a serviço do regime soviético, a fim de descobrir se os japoneses cumpririam ou não o pacto firmado com a Alemanha nazista de tomarem medidas contra a "ameaça internacional comunista"(Pacto Anti Komintern): a Rússia temia ataques japoneses, escaldada que estava pela Guerra Russo Japonesa (1904/1905). Sorge juntou  informações sobre as relações entre Japão  e Alemanha, bem como  sobre a indústria pesada e exército japonês. Por sua elevada reputação como jornalista do Frankfurter Zeitung, Sorge estreita laços de amizade com o general alemão Eugen Ott, que se tornaria embaixador de seu país em Tóquio. Virou seu amigo e confidente íntimo, além de se tornar amante de sua mulher.A nomeação de Ott foi facilitada pela ação de Sorge, que lhe forneceu informações, auxílio em suas análises e o material sobre o Japão que havia reunido. 

Epicurista, passava despercebido pelos serviços de contra espionagem. Ninguém sabia que aquele "herói" de guerra alemão, aventureiro, mulherengo, escritor e jornalista, intelectual marxista que frequentava bordéis era, na realidade, um agente soviético e um dos melhores espiões do mundo.

Em outubro de 1941 as tropas alemãs cercavam Moscou e se aproximavam de uma vitória que poderia ter mudado o curso da história. Isto só não ocorreu porque os soviéticos receberam um comunicado dos agentes comunistas em Tóquio, informando que o governo japonês rompera o pacto com a Alemanha e decidira não atacar a União Soviética. Graças a esta informação dada seis semanas antes de Hitler invadir a Rússia, um milhão de soldados da URSS, a postos na fronteira da  Manchúria contra um iminente ataque japonês, puderam ser deslocados para Moscou, a fim de derrotar os alemães. O homem responsável pelas informações que mudaram o destino da guerra foi Richard Sorge,  que, de acordo com o escritor e diplomata alemão Hans-Otto Meisner, que o conheceu pessoalmente, era 

"um "aventureiro e cínico, com grande entusiasmo pela vida, mas também um homem amargurado, que abraçou com fervor a causa comunista, tornando-se um dos maiores e mais perigosos espiões de todos os tempos. Com um cartão do Partido Nazista em uma das mãos e um do Partido Comunista russo em outra, fez jogadas que mexeram com os maiores exércitos de seu tempo. (...) Desenvolveu um sistema próprio de espionagem  e um padrão pessoal de eficiência.Tornou-se um notável linguista, falando notavelmente alemão, russo, inglês e francês . Mais tarde aprendeu vários dialetos chineses e japoneses. Acreditava ter assimilado as tradições históricas e culturais de cada país para o qual fora designado e considerava isso essencial para poder penetrar nas mentes dos homens - e todos os homens eram seus adversários".

(extraído do livro "O homem de três faces", de Hans-Otto Meisner)

Sorge passou, também,várias outras informações importantes para a URSS, como a data do início da Operação Barbarossa - desacreditada por Stalin (nome como ficou conhecida a operação militar alemã para invadir a União Soviética, iniciada em 22 de junho de 1941).

Depois disto, o espião, ainda de acordo com Meisner, mostra sua terceira face, desprezando - com sua arrogância e "febre de poder" - amigos e inimigos. As suspeitas dos japoneses cresceram. Usaram de seu epicurismo para laçá-lo: correndo atrás de orgias e de mulheres, caiu em uma armadilha e foi preso: Ozaki Hozumi, um jornalista japonês do Asahi Shimbun que trabalhava para Sorge, foi preso no dia 14 de Outubro de 1941. Interrogado, acabou entregando Sorge, sendo este preso alguns dias depois, a 18 de Outubro, em Tóquio e encarcerado na prisão de Sugamo. Durante seu julgamento, Sorge assumiu toda a responsabilidade pelas ações de seus colegas espiões, que já haviam revelado muita coisa. A sentença foi adiada por prazo indeterminado, por ordem do coronel Osaki, que elucidara o caso e queria "cavar mais fundo", para chegar às implicações internacionais da unidade de Sorge. Foi permitido  pelo Japão que vários jornalistas e amigos do espião o visitassem e, diante deles, Sorge se gabava, dizendo que nunca seria enforcado. Garantia que tinha o aval de Stalin, acreditando que seria trocado por prisioneiros políticos capturarados pelos russos.

 Permaneceu confinado por quase dois anos após sua prisão,quando foram condenado à morte em dezembro de 1943.Sorge mesmo falou em sua defesa e na de Osaki.: fez uma defesa com argumentos fracos, mas talvez os únicos possíveis, na qual o principal ponto era provar que não utilizou, em momento algum, de trapaça, já que ele conseguia os dados na Embaixada daAlemanha, onde eles eram-lhe transmitidos voluntariamente, não tendo ele lançado mão de nenhuma artimanha ou chantagem, nem forçado o embaixador a nada e que as informações que havia conseguido a partir das anotações de Eugene Ott, o governo japonês havia deixado vazar, fornecendo-as à Embaixada alemã.A Suprema Corte rejeitou as apelações em 1944, tendo início a fase de tortura mental: não lhe foi informada a data da execução. Os japoneses não permitiam que jornalistas alemães visitassem Sorge, já que ele havia renunciado à cidadania alemã em troca da cidadania russa em 1917.Depois disto, coisas estranhas aconteceram no presídio onde estava confinado Sorge:seu diretor, o coronel MMatsuoto, mandou chamar o dentista mais caro de Tóquio e lhe encomendou um par de dentaduras para Sorge, tendo sido o próprio dentista quem espalhou esta notícia. Dias mais tarde, ocorreu o mesmo fato com um alfaiate super caro, responsável por confeccionar um terno novo e uma camisa para o espião. Enquanto isto, novas apelações foram feitas.

Sem avisos, chegou o dia fatal. Abro um parêntese para falar sobre a narração, no livro de Hans-Otto, da motre de Ozaki, uma das partes mais interessantes deste livro, narrando os costumes e as cerimônias japonesas nestas ocasiões.Foi enforcado logo após a benção final:

"Vida e morte são uma coisa só, para alguém que alcançoua beatitude impessoal. A beatitude impessoal pode ser alcançada confiando-se tudo à misericórdia de Buda". 

Puxaram o laço e Ozaki morreu.Era 9:50 hs. da manhã.

No 1.100º dia de confinamento, chegou a hora de Sorge. "Estou pronto", disse o espião.Ao ser perguntado se queria um padre católico para assisti-lo em seus momentos finais, respondeu, apontando para o sacerdote budista:

"Não. Se eu quiser um deus, o dele será tão bom quanto qualquer outro".

Consta do relatório oficial que, na hora de sua execução, Sorge gritou: "Para o inferno com a espécie humana!"

Era o dia 25 de outubro de 1944 (7 de Novembro pelo calendário Gregoriano) - aniversário da Revolução Russa, ambos são enforcados, não tendo sido trocados por prisioneiros. Alguns dizem que isto ocorreu possivelmente devido ao receio de Stalin de que se soubesse que ele tinha ignorado informações sobre a Operação Barbarossa. Assim, o sua crucial ajuda permaneceu ignorado por vários anos até que, em 1964, recebe o título de Herói da União Soviética, sendo erguida a sua estátua em pleno centro de Moscou:

 Estas duas execuções colocaram ponto final no caso Sorge, pelo menos nos círculos oficiais.

Existe a suspeita de que, talvez, ele possa não ter sido executado. Senão, vejamos: fim da guerra, os horrores de Hiroshima e Nagasaki, a rendição japonesa. A entrada das tropas aliadas em Tóquio. Um dos primeiros decretos militares estava a soltura de todos os presos políticos. Muitos haviam perecido, mas um dos cinco grupos de Sorge sobreviveu. Alguns voltaram para a Rússia, outros partiram para o ocidente e, em meio a toda aquela confusão surge um rumor: Sorge está vivo!

Para finalizar: em 1947, num clube noturno de Xangai, Kiyomi, uma moça que havia traído a confiança de Sorge, cantava no clube. De repente fixa o olhar em algum ponto e se cala.Com um grito, corre para o camarim, pega sua bolsa e sai correndo pelas portas do fundo. Membros do clube correm atrás dela e chegaram a vê-la virar a esquina.Ouvem três tiros, que ressoam na escuridão.O corpo de Kiyomi ficou estendido na sarjeta. Ela foi a única mulher que Sorge havia amado de verdade.Muitos artigos oficiais de Tóquio, tanto de alemães como de japoneses, acreditam que bem antes da "execução" Sorge já tivesse uma nova identidade. Semanas antes de sua execução, ele escolhera a cidadania russa. Imediatamente após este fato, vieram o tal dentista caríssimo (dr. Takahashi) que substituiu seus dentes naturais por próteses artificiais fixas. Veio, também, o tal alfaiate. O alfaiate seria explicável para lhe confeccionar roupas novas para sua execução, só que ele permaneceu muito tempo na prisão depois disto. Com base nestes dados, o ex diplomata e escritor alemão Hans Otto Meissner construiu sua tese de que Sorge não morreu. Afirma ainda que a pena de morte foi muito adiada e só uma negociação entre Japão e Rússia a respeito do destino do espião poderia explicar este adiamento.

Outro fato interessante é que, nos registros da prisão japonesa possuem a lista das testemunhas oficiais da execução: nenhum estrangeiro esteve presente, conforme era regra inviolável da lei japonesa: membros da família do condenado ou funcionários diplomáticos deveriam representar um estrangeiro condenado ao enforcamento. No caso de Sorge a lei foi descumprida? Ou não houve execução de fato? Também a regra da lei japonesa era avisar o parente mais próximo ou os representantes diplomáticos sobre a disponibilidade do corpo para o enterro foi descumprida??? Não avisaram ninguém. No caso de Ozaki, sim, avisaram: dez minutos depois de executado solicitam à família que removessem seu corpo. Será que Sorge não teria sido entregue vivo a alguma delegação russa?

Hans-Otto termina seu livro com a seguinte declaração:
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"Gostaria de salientar que meu serviço diplomático e militar contou-me que a troca de espiões valiosos capturados está longe de ser uma raridade. Em alguns casos os espiões são primeiro julgados, acusados e condenados à morte. A execução é anunciada numa declaração sucinta para a imprensa(...) A troca, é realizada secretamente".

Com base nisto, Meissner acreditava (em 1955) que Sorge estivesse vivo e ativo na espionagem soviética.

 Sorge

 Monumento a Sorge em Baku

Família Sorge:ao centro, o pequeno Richard com o pai

Fontes:

-Livro "O HOmem de Três Faces(Hans-Otto Meissner)
http://www.baku.ru/

www.wikipedia.com

http://www.phenomenonsofhistory.com